Massa à Carbonara

e o poder da simplicidade

A simplicidade é o último grau de sofisticação.

Leonardo da Vinci

Gostamos de complicar as coisas sem necessidade. 

Pensa comigo:

  • 6 ovos

  • 200g de queijo pecorino 

  • 250g de guanciale (ou bacon se você quiser matar um italiano do coração)

  • 500g de Spaghetti

  • Sal e pimenta à gosto

Coloque água para ferver. Na sequência, coloque 4 ovos inteiros + 2 gemas em uma tigela, adicione o queijo e a pimenta.

Coloque a massa na água fervente (já com sal).

Frite o guanciale e, quando ele estiver crocante, reserve em um prato (sem tirar a gordura da panela).

Quando a massa estiver no ponto, coloque-a com um pouco de água do cozimento na frigideira com a gordura do guanciale. Adicione a mistura de ovos com queijo e pimenta e misture em fogo baixo até ficar na consistência correta.

Adicione o guanciale e “mangia che te fa bene!”

Conheço poucas receitas tão icônicas e curtas como a Carbonara.

A Carbonara é uma receita especial para mim, ainda mais hoje, Dia dos Pais.

Foi meu pai que me apresentou e sempre fazia a receita em ocasiões especiais.

Olha a Carbonara na mesa ali

O segredo do seu sabor é justamente a simplicidade (aliada a uma qualidade muito grande dos ingredientes).

Como já disse Saint-Exupéry: "A perfeição é alcançada, não quando não há mais nada a acrescentar, mas quando não há mais nada a retirar."

São 6 ingredientes, pouquíssimos processos, muito sabor.

Em 20 minutos você tem uma bela refeição.

Sei que este início pode parecer aleatório, mas foi o pensamento que me acompanhou na corrida (será o meu almoço de logo mais 🍝).

É relativamente fácil encontrar uma Carbonara em restaurantes e buffets pelo Brasil. No Rio Grande do Sul é bem comum, inclusive. 

Agora é muito, mas muito difícil achar uma com a receita original e tão boa quanto a feita na Itália. 

Imagino que é o mesmo sentimento dos mineiros ao comer pão de queijo fora de casa ou dos gaúchos ao comer churrasco bem passado: uma mistura de felicidade com se sentir levemente ofendido.

Por que mexer na receita original se ela funciona tão bem?

Falando de Carbonaras, já comi versões com creme de leite, versões que mais pareciam omelete com massa, versão com linguiça, enfim, algumas atrocidades culinárias.

Mas meu objetivo aqui não é pregar visões culinárias e sim mostrar como o exemplo da Carbonara pode nos dar uma lição valiosa sobre negócios.

Uma lição que nos leva diretamente ao percurso de hoje: o poder da simplicidade.

Meus últimos anos como consultor me mostraram que é difícil fazer o simples, é difícil não inventar moda em cima de alguma coisa que funciona.

E não me entenda mal, não há nada de errado em querer dar “o seu toque” nas coisas.

Só que tem algumas visões aqui que são relevantes.

  1. Simplicidade não é sobre fazer menos. É sobre fazer só o que realmente importa. E, para saber o que realmente importa, você precisa estudar muito

  2. Criar complexidade é muito confortável para quem não quer decidir ou arcar com as consequências da decisão. Se não deu certo, a culpa já tem nome. A verdade é que a complexidade disfarça a insegurança. Simplicidade revela clareza.

  3. Se você quer melhorar o que já funciona muito bem, antes precisa dominar a arte do fazer com excelência. 

Todas as Carbonaras que tive a oportunidade de experimentar na Itália (e não foram poucas) eram muito similares entre si. 

Desde a feita pela “nonna” até a dos restaurantes mais conhecidos.

Todas seguiam à risca a receita original. Ingredientes de extrema qualidade e excelência na execução e na técnica de preparo. 

A diferença entre elas ficava em algum detalhe na finalização.

O resultado é que todas eram fantásticas (muito diferente do que vemos pelo Brasil).

Por aqui, adicionamos creme de leite para dar cremosidade (ao invés de fazer o processo certo). Trocamos o queijo pecorino por outro mais barato para reduzir custos. Fazemos o ovo à parte e deixamos ele pré-pronto (o que faz ele virar quase um omelete) para ganhar suposta velocidade. E por aí vai...

Vejo três grandes motivadores para isso (e, novamente, isso não é sobre culinária):

  • A busca constante por um atalho: se fazer o certo parece um pouco complexo e exige cuidado, vamos buscar uma forma de somente parecer certo e ainda fazer mais rápido (também conhecido como preguiça e prepotência)

  • A falta de busca por conhecimento: às vezes a pessoa não foi atrás da receita original, não foi buscar informações e mesmo assim já se acha pronta para a ação (também conhecido como arrogância ou desinteresse)

  • Não conhecer a lógica de processo: se o seu input (insumos de entrada) for ruim, muito dificilmente o output (resultado) será qualificado (também conhecida como falta de preparo e de domínio do processo)

Se você tirar isso do contexto da massa e colocar em um contexto empresarial, entende o motivo do serviço de tantas empresas brasileiras ser uma grande merd*.

E, claro, entende também como as empresas ganham milhares e milhares de clientes fazendo o simples que funciona: bom produto, bom atendimento e cuidado genuíno com as pessoas.

Parece tão mais fácil do que ficar tendo que inventar técnicas e “hacks” de marketing, monetização e enganação de clientes...

Eu escolhi o exemplo da Carbonara, porque é um dos meus pratos favoritos e porque ela permite, de forma simples, uma segunda analogia interessante.

A base do prato é a massa. A massa é como se fosse o conhecimento da nossa empresa (ou nosso individual). Ele é a base em cima do qual construímos as coisas. 

Assim como a massa, ele pode ser “feito em casa”, com cuidado, escolha dos insumos (fontes de conhecimento) e diferentes técnicas de preparo (aprendizado).

Ou, pode ser comprada pronta de acordo com o que funcionar melhor para o objetivo.

Fato é, assim como não tem como fazer uma boa Carbonara sem uma boa massa, você não consegue construir algo relevante sem conhecimento.

Na Carbonara, o que dá a liga, o que conecta os ingredientes do prato, são os ovos. Bom, os ovos no contexto empresarial são as pessoas. 

Coloque demais e a coisa desanda. Tenha um podre no meio dos bons e o todo acaba se estragando.

O guanciale e o queijo são seus dados e informações. Quanto maior a qualidade, na proporção certa, mais você eleva a qualidade do seu produto final, seja ele uma Carbonara ou um planejamento de ações da sua empresa.

E o modo de preparo da massa são seus processos. Não adianta nada ter bons insumos e produtos se não se sabe como usá-los. 

E assim como fazer uma boa Carbonara é simples, ter uma estrutura de empresa sólida também é.

Conhecimento, pessoas, dados e processos de extrema qualidade. Você não precisa nada mais do que isso.

Invariavelmente, vender isso será como vender uma Carbonara: você não vende, as pessoas é que compram.

Ahh, para não deixar margem de interpretação: eu falei simples, não fácil.

Afinal, a simplicidade é o último grau de sofisticação.

E chegar lá não é nada fácil.

Seu momento de refletir

- O que você tem complicado sem necessidade?

- Como poderia aplicar uma abordagem de simplicidade nos seus problemas?

Espero que tenha curtido o percurso de hoje.

Grande abraço, um feliz dia dos pais aos papais leitores e em especial para o Seu César, meu Pai.

Até a próxima milha,

César Mazzillo

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Dados no Cotidiano

Menos opções = mais compras

Existe um experimento feito pelos pesquisadores Sheena Iyengar e Mark Lepper da Universidade de Columbia e Stanford que mostrou que reduzir opções de escolha (simplificar) aumenta a conversão.

Embora o estudo tenha sido feito há algum tempo (nos anos 2000), ele traz visões interessantes sobre como tomamos decisões (e como empresas devem levar isso em consideração para melhorar o seu resultado)

O teste feito (que precisaria ser aprofundado em outros contextos e produtos, diga-se de passagem) comparou o volume de compras de um supermercado em dois cenários:

- Uma mesa de geleias que oferecia 6 sabores

- Uma mesa de geleias com 24 sabores.

Embora a mesa com 24 sabores atraiu muito mais pessoas e as deixou mais tempo olhando os produtos, a opção com 6 sabores vendeu 10 vezes mais. 

Tá aí o estudo que dá estatística para a frase “menos é mais”.

Vá uma milha a mais

Falando sobre simplicidade, não teria como recomendar uma milha extra diferente do que o livro “Incrivelmente Simples” de Ken Segall.